quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

A vida da Aldeia

S. Martinho de Anta, Natal – A vida tem na aldeia um ritmo que a cidade nunca poderá entender. Cada compasso, aqui, dura um ano certo. Porque se mata o porco só pelo Natal, se os salpicões ficam salgados passam-se trezentos e sessenta e cinco dias a repetir:
- Os salpicões ficaram salgados.
A correcção apenas se poderá fazer no ano seguinte.
Cada semente que a mão lança à terra, cada árvore enxertada, cada lagar de vinho, prendem o homem a um pelourinho de expiação de doze meses. Desde que haja engano numa realização, só na próxima sementeira, época ou colheita se poderá retomar a liberdade, para de novo semear, enxertar e pisar – e apagar da própria lembrança e da dos vizinhos o erro vital cometido.


Miguel Torga, in “Diário IV “– 4ª edição, pág. 142

Fotografias ,Pimeirol, Agosto de 2003
Beirós, Setembro 2007

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